7.4.09

Projeto Magia Segunda Parte: Vilarejo sem almas.


(Continuação de um projeto que ainda não se sabe onde vai dar


Segunda parte escrita por Débora Borges)


Continuaram daquele jeito, caminhando apressadamente e sem se falar por um tempo que Enoski não soube determinar. Poderia ter sido apenas alguns minutos, mas o turbilhão de duvidas que o atormentava internamente faziam cada segundo de espera ser torturantemente longo.


Aos poucos tudo foi ficando mais claro, as arvores foram sendo substituídas por arbustos baixos, pedras, cascalhos e por fim, pavimento. Estavam agora caminhando pela rua, mas Enoski jamais estivera ali. Não teria se esquecido de estar em um lugar tão diferente. As casas eram todas escuras, frias e aparentavam abandono de séculos, mas podia ver que havia moradores ali. Não havia vozes em lugar algum, somente o som do vento cortando por entre as ruelas, mas divididas. Todas aquelas pessoas, se é que eram pessoas de verdade pensou Enoski, pareciam que viviam em uma cena ensaiada. Ninguém se olhava, ninguém falava, sequer pareciam ter a mínima noção de que estavam ali, na rua, juntos. Enoski prestava o máximo de atenção á sua volta, foi quando percebeu enfim que já não avistava Natthali. Ela sumira! “Há! Mas isso é realmente perfeito”, pensou, “perdido num lugar destes que eu sequer tenho noção em que parte do mundo fica... Alias, Natthali dissera que eu não estava mais no meu mundo. Há! Se melhorar estraga.” – Sentiu o nó em sua garganta começara a apertar, aquela sensação de desespero subia-lhe pelo corpo. Suava frio. Considerando se seria seguro chamar atenção de um dos transeuntes e perguntar onde ele estava; Enoski viu, com extremo alivio, o olhar penetrante que procurava o seu. Aqueles inesquecíveis olhos castanho-esverdeado olhavam para ele com a frieza e preocupação que um leão olharia para uma presa prestes a escapar. Sentiu ao mesmo tempo, alivio e um arrepio de duvida percorrer-lhe o corpo. O medo brotava com intensidade cada vez maior.


Natthali esperava por ele na porta de entrada de uma das casas de má aparência, já meio corpo para dentro e quando Enoski encontrou seu olhar ela desapareceu porta adentro. Enoski considerou rapidamente quais as suas possibilidades de fugir dali, não encontrando alternativa mais confortante, decidiu mais uma vez segui-la. Subiu os degraus de entrada daquela casa mal cheirosa, respirou fundo uma ultima vez e tomado de súbita coragem, entrou. As coisas ali dentro não pareciam muito melhores do que lá fora. Que espécie de lugar era aquele? As mesmas pessoas da rua acumulavam-se pelos cantos da casa, sem encostarem-se. Enoski decidiu também evitá-las. Vislumbrando um resto de capa preta desaparecer pela curva do corredor, apressou o passo em acompanhá-la. Na virada do corredor trombou desastrosamente com Natthali que havia parado para lhe esperar. Embolaram-se os dois, rolaram por uma escada de pedras que descia por um corredor frio e escuro. Quando aterrissaram no ultimo degrau, Enoski voou contra a parede. Natthali já de pé o encarava com ares de quem estava prestes a atacar. Ele, não tendo alternativas ficou ali de pé, parado, sustentando o olhar dela, esperando pelo que viria a seguir. De repente Natthali relaxou. Respirou fundo e seu olhar agora lembrava o de um gato de armazém. Enoski relaxou também e pode lembrar-se de respirar.


- Me desculpe – Apressou-se em dizer – Eu não queria te perder de vista de novo, eu não tenho idéia de onde estou; é tudo muito estranho por aqui. Eu... Só não queria me afastar de você de novo, não vi que você tinha parado e...


- Tá ok, tudo bem – Interrompeu – Eu realmente deveria estar cuidando melhor de você, não seria de muita utilidade se eu te perdesse por aí. Agora vamos, eles estão esperando por nós.


E dizendo isso sumiu na escuridão do corredor de pedras. Enoski podia ouvir os passos dela ecoando pelo corredor, logo mais a sua frente. Sabia que ela estava apenas a alguns passos e apressou-se em segui-la de perto, tendo o cuidado de manter certa distancia apenas.

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Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento