13.3.10

Plano perfeito

Sexta-Feira.

Marcus revisa os planos pela décima vez naquele dia. Ele sabe que tudo tem que sair perfeitamente e ser minuciosamente executado. Não pode deixar nada de fora, todos os detalhes foram planejados há um mês. Marcus agora revisa o final do seu plano, ele é uma pessoa organizada durante o mês deu cabo do material e dos contatos necessários para que o dia seguinte fosse perfeito. Sua organização é tão grande que tem tudo em planilhas e gravado em voz para escutar. Sua vida toda é organizada desde a sua casa até o que vai fazer em todas as horas do dia em que está acordado suas meias são organizadas por cores, as camisetas por tamanho e cor, livros e filmes em ordem alfabética e por ordem alfabética de escritores e diretores.

O dia de sábado deferia ser impecável, os seus planos estavam, segundo ele, perfeitos.


Sábado.

Marcus acorda-se cedo e começa a executar suas tarefas do dia. Às seis horas da manhã dirige-se para a casa de sua “namorada”, não é bem namorada, mas ele tem certeza de que um dia será, principalmente depois desse dia que ele planejou com afinco. É cedo para Maria estar acordada, a vizinhança dorme igual sono, Marcus larga um pacote no pátio e espera alguns minutos até ver o cachorrinho se aproximar para ter certeza que o pacote iria ser encontrado.


Às sete horas da manhã vai ao bar do seu Joaquim acordar Paolo que dorme nos fundos do bar. Paolo foi um rapaz que começou a trabalhar no bar por indicação e arranjo de Marcus, sendo assim o menino devia um grande favor a ele. Deixa um pacotinho pequenininho com Paolo e lhe dá as instruções mais uma vez, pois já havia dito dias antes a ele como seria a execução do plano, mas por precaução deixa uma fita de áudio com as instruções gravadas e uma folha escrita com o mesmo conteúdo do áudio.


Às sete e meia passa pela rua Vinte e Um de Abril onde encontra o carro vermelho estacionado em frente a casa grande da rua. Aproxima-se do carro e deixa o terceiro pacote dentro do porta malas – para isso teve que arrombar o carro, mas ninguém estava na rua aquela hora e Marcus passou um mês treinando arrombamentos e eletrônica para cancelar o sistema de alarmes do carro. A operação é rápida e em menos de dez minutos o serviço está feito.


Agora era voltar para casa e esperar pela noite. Ao voltar pelas ruas o movimento na pequena cidade de Goiabeira da Serra começa com os velhos saindo para a caminhada matinal.


Noite de Sábado. 19 horas.

Quando a noite chega na cidade Marcus caminha sossegada até a praça da cidade, sai as 19 horas de casa e em quinze minutos de caminhada lenta chega a praça da cidade onde os adolescentes e jovens começam a ocupar ela procurando lugares mais próximos ao bar do seu Joaquim. Por volta das 19:30 chega a pessoa que ele estava esperando, ela se dirige ao bar do seu Joaquim e pede uma cerveja, Paolo lhe entrega aberta com um copo americano, típico de butecos. Paolo serve o primeiro copo e Marcus espera. As 19:45 Jonh morre de ataque cardíaco na mesa do bar do seu Joaquim, as autoridades – policia e enfermeiros da cidade, dirão mais tarde que a morte foi natural e não acidental.


Marcus do outro lado da praça observa. A praça enche de curiosos e ele aproveita para as 20 horas sair da praça se encaminhando para a casa da sua “namorada” onde constata que o cachorrinho encontrou o pacote e comeu o conteúdo. Segundo informações obtidas com a vizinha ao lado o cachorro amanheceu morto, ninguém sabe a razão mas foi uma tristeza para Maria e para sua mãe.


As 20:15 Marcus volta para a praça os curiosos ainda comentam sobre a morte repentina do jovem Jonh. Marcus vê que a hora do seu plano terminar está próxima, as 20:30 vê o carro vermelho passando pela praça ele pega o telefone e disca para Maria. O Carro explode ao passar pela praça todos são tomados de surpresa e correm para acudir o motorista, mas já é tarde a explosão consome o carro em chamas. Os bombeiros demoram para chegar e o número de curiosos aumenta proporcionalmente até que quase toda a cidade esteja na praça comentando as duas mortes estranhas. No laudo da policia iria constar falha mecânica e super aquecimento do motor junto com faíscas do cigarro que o ocupante do carro fumava teria provocado a explosão acidental.


As 21 horas Marcus vai para casa. Mais tarde deitado em sua cama avaliaria o seu dia e teria certeza que o plano havia ocorrido perfeitamente: O ex-namorado de Maria morrera em uma explosão dentro de seu carro, o garanhão da cidade Jonh, que dava em cima de Maria morrera de ataque cardíaco e por fim o cachorrinho Fred, presente do ex-namorado de Maria morrera de envenenamento.


Marcus pensou consigo mesmo que o trabalho foi bem feito e nada tinha a ver com o ciúme que sentia.



Elisandro Rodrigues

6.3.10

Flores na parede

Marcos estava deitado na rede olhando o estranho quadro na parede da casa de Julia, sua amiga. O quadro era uma janela com dois vasos de flores pendurados. Nas flores pequenos botões nascendo. Fora chamado para uma reunião como havia poucas pessoas e a conversa acabou tomando outros rumos com violão e um mate.

Marcos pensava no vazio do significado do quadro e na paixão que aumentava e corroia a saudade no seu peito. Ia moldando seus pensamentos em formato de janelas: abrindo uma, fechando outra, esbarrando sem querer com o olhar nas flores. Pensamentos de flores, de ventos e janelas. A conversa das meninas deitadas no colchão tocando musica era sobre os amores e as distâncias.

Ele deixava o pensamento acariciar a distância e as lembranças doces da saudade amarga. Colocava pedaços da menina do sorriso e dos dedinhos para dentro dele a todo instante, como um mantra lembrava-se do seu sorriso o que acalentava a alma e o deixava mais tranqüilo.

O quadro estranho na parede estava lá com suas flores e janelas abertas para um vôo livre do pensamento. O embalo da rede lembrava o colo e os abraços de seu amor. Lembrou de uma passagem de Rubem Alves “o amor mora nas presenças das ausências”. Na arquitetura de surpresas ela se fez [na]morada. A tranqüilidade da rede e o embalo da música tocada “...um beija-flor invadir a porta da sua casa te der um beijo e partir fui eu quem mandei o beijo...” assim como o beija-flor que dá o beijo e parte ele adormeceu pensando na janela com flores e no seu amor.

Elisandro Rodrigues

5.3.10

Caminhos de Bicicleta

Como era de costume ele chegou mais cedo no ponto de encontro, na verdade o ônibus chegara quinze minutos antes do horário previsto. Ao descer do ônibus ele deu uma olhada em volta e não a encontrou. Mandou uma mensagem para ver onde ela estava, acreditava que ela não viria, mas mesmo assim um fundinho de esperança restava em seu coração. Pegou sua mochila e foi para a primeira cantina tomar um café e afastar o sono.

A mensagem dela chegou alguns minutos depois, quando ele estava tomando seu café dizia “chego em cinco minutos”. Ele terminou o café devagarinho pegou sua mochila e se encaminhou para fora da rodoviária. No meio do caminho viu-a dobrando um corredor em sua direção. Era bonita, mais alta do que esperava, e mais bonita do que esperava vinha com um sorriso nervoso no rosto e com os indicadores num gesto que mais tarde entenderia.

O primeiro contato foi estranho, o abraço meio desajeitado por causa da mochila nas costas, uma intimidade de pessoas que nunca se viram nos olhares. Ela estava tensa e nervosa. Ele tranqüilo na espera do que iria acontecer. Ela conduziu ele para um bar na frente da faculdade, subiram a rua Santa Clara até a General Osório. Ele ia descontraído tentando achar formas de quebrar o gelo e ver no que daria aquele encontro. Subindo a Santa Clara ele parou para descansar em uma praça e ela pensou “e por que não agora”.

Chegou perto dele colocou a mão atrás de sua cabeça e chamou-o para um beijo longo e intenso com gosto de chiclete. Ele ficou sem saber o que fazer e retribuiu o beijo. Depois de quarenta segundos do primeiro beijo ele a beijou novamente com carinho e paixão. E assim seguiram caminhando para um buteco tomar suas primeiras cervejas de muitas.

Elisandro Rodrigues

Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento