“Agosto sempre chove e faz frio” pensava o velho sentado em sua cadeira de balanço. O frio do inverno se mostrava rigoroso como sempre. Cada dia que passava ficava mais difícil para aquele velho organizar o seu pensamento. Vivera uma vida com intensidade, sua memória sempre fora boa, mas nos últimos dias estava difícil lembrar. Passava o dia sentado. O colocavam na sacada pela manhã para pegar sol e a tarde no pátio junto com os outros velhos que ocupavam a casa. Havia sofrido um derrame anos atrás perdendo a capacidade de se comunicar. Quando queria alguma coisa escrevia com uma letra tremida em um pequeno bloco que carregava com ele.
Naquela tarde chuvosa e de frio ele tentava organizar o pensamento entre as poucas lembranças que vinham à tona. “E aquela menininha, como era mesmo o nome dela....com que letra começava...C, não....J....hum Gabi, isso Gabriela era o nome dela. Menininha fofa, cada vez que ia na casa dela ficava horas brincando. Que tempo bom aquele. Tempo de juventude, correria....de produção cultural. Boraimbolá o nome daquela banda. A gabi....deve ter crescido bastante. Por onde anda aquele pessoal todo????....”
As lembranças de certas pessoas o deixavam sensível. Entre uma lembrança e outra uma lágrima escorria pelo seu rosto. “Crianças...a minha priminha Dessa. Minha irmã...que falta faz a gente brincar. Todos os amigos, todos os amores.....ahhh os amores...”
Esquecidos ficam os pensamentos em nossa cabeça. Esquecido permanece o nome dela dentro do Patuá. O nome da menina mulher com quem construirá sonhos e esperanças. “...aquele beijo...o primeiro beijo meio tímido naquela festa...ou era um show...não me lembro, mas daquele beijo, daqueles lábios finos e gostosos....”
As lembranças aos poucos vão se apagando o sono começa a chegar o final da tarde. Os olhos cheios de lágrimas assim era o dia daquele velho, entre sol e frio, entre memórias e lágrimas, entre lembranças e saudades dos tempos passados.
Elisandro Rodrigues
Jogos de amar (Richard Serraria)
Durante o sono me acordo
Quando deito me levanto
Em sonos que são meus
Em sonhos que são teus
Vista do alto a cidade é um bagulho muito doido
De noite o mundo é escuro
Caminhos, carros,
postes, luzes
O tempo escorre fundo
O tempo é coisa de outro mundo
Compreendo que duvido
O anel que tu me destes não era vidro
O amor que tu me tinhas
Apenas começou
Apenas começou
Durante o sono me acordo
Quando beijo me encanto
Encantos que são meus
E lábios que são teus
Vista do alto a cidade é um bagulho muito doido
De noite cachorros latem no escuro
Carrinhos, posses,
credos, cruzes
O tempo escorre junto
O tempo é coisa de outro mundo
Compreendo o que duvido
Vista do alto a cidade é um bagulho
muito doido, vista no colo a menina tão bonita pequenina, vista no colo a
Cecília ela é a minha filha...
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