Um presidente legal, um presidente legítimo
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Tanto Felipe Calderón, da direita, quanto Andrés Manuel Lopez Obrador, apoiado por vários movimentos populares, se declaram chefes do Executivo mexicano
Pedro Carranode Curitiba (PR)
No confronto direto com a democracia representativa, a luta social
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Assembléias Populares são mecanismos de pressãono México teve no dia 20 de novembro mais uma data importante. Foi neste dia que Andrés Manuel Lopez Obrador (AMLO) tomou, como forma de protesto, a faixa presidencial e lançou os 20 pontos do seu chamado "governo legítimo". O programa pretende defender as classes sociais que sofrem diretamente o resultado das escolhas da classe política dominante mexicana: as privatizações e o tratado de livre comércio, para citar algumas.
O presidente "legal", ou seja, reconhecido pelas instituições do país, Felipe Calderón, representa a continuidade das políticas que beneficiam apenas os mais ricos. Os movimentos sociais mexicanos não reconhecem a vitória de Calderón nas eleições de julho, que consideram fraudulenta.
Os 20 pontos de Obrador definem diretrizes para diminuir o preço dos produtos de consumo das camadas populares, comprometer-se em não privatizar dois setores que ainda resistem - o elétrico e o petrolífero -, gerar melhores condições para a população, sobretudo no campo, para que as pessoas não tenham que ir trabalhar nos EUA. Entre outras reformas do Estado, ele propõe que o exército não atue mais nas questões sociais. Porém, a ambição mais ousada da proposta é fazer com que o governo "legítimo" tenha relações diretas e organizações de base em vários rincões do país.
Não por acaso o 20 de novembro também foi um momento de mobilização do movimento zapatista, em comemoração do aniversário da revolução mexicana, cujos primeiros anos, a partir de 1910, foram transformadores e deixaram marcas na luta popular, e em protesto à repressão ocorrida em Oaxaca. Neste dia, os zapatistas fecharam vias de acesso às principais cidades de Chiapas. As estradas ficavam até 45 minutos interrompidas, sendo abertas por 15 minutos. Houve atos de solidariedade em outras cidades do mundo e no Brasil aconteceu em São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, entre outras.
No mesmo dia, em Oaxaca, houve confrontos entre a polícia federal preventiva mexicana e estudantes simpatizantes da Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO), deixando vários feridos e a denúncia de perseguição policial a jornalistas. Um contato que está no local contou para a reportagem do Brasil de Fato que a polícia ultimamente tem trocado os confrontos diretos pela estratégia de perseguir individualmente os membros do movimento.
Um governo concreto
Alejandro Buenrostro, idealizador do centro de informação zapatistaXojobil, faz questão de ressaltar que o "governo legítimo" de Obrador nada tem de simbólico. Na verdade, ele vai contar com representantes em todos os estados mexicanos e inclusive no Parlamento, com os políticos ligados a Frente Ampla Progressista - um dos braços de sustentação de Obrador.
O outro braço seria a Convenção Nacional Democrática(CND), uma entidade civil não permanente. Alejandro nos conta que ela teve o seu primeiro desenho em 1910, à época da Revolução Mexicana. Mais tarde, noutro momento histórico, teve presença em 1988, quando o candidato do Partido da Revolução Democrática (PRD), Cuauhtémoc Cárdenas Solórzano, foi impedido de chegar ao poder às custas de fraude nas eleições. Venceu o neoliberal Salinas de Gortari, do Partido Revolucionário Institucional (PRI).
E qual a razão de uma convocatória da CND? Para Alejandro, "ela tem o caráter de convocar lideranças populares para reestruturar a república, num determinado momento histórico", lembra. "Neste momento a CND já terminou e ficou decidido por todos aqueles que o apoiaram que Obrador é o presidente", comenta. Alejandro ainda faz o paralelo com a figura de Benito Juarez, que foi um presidente itinerante e popular no século dezenove, à margem do poder de Maximiliano, que era apoiado por uma elite conservadora.
Racha?
O PRD e o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) eram aliados, nos anos 1990. Atualmente, há um rompimento entre eles.
A primeira reuniãopreparatória da Outra Campanha - convocada pelo EZLN na antológica Sexta Declaração da Selva Lacandona, em 2005, como forma de organizar a população mexicana de modo paralelo à institucionalidade - simbolizava uma postura inesperada: o subcomandante Marcos colocou que Obrador e o PRD igualam-se aos outros dois partidos de direita, o PRI e o PAN, ao ter votado contra os Acordos de San Andrés (pelos direitos indígenas), financiar grupos paramilitares em Chiapas e sinalizar para os jornais gringos que não mudaria a economia do país.
Naquele momento, a Outra Campanha dizia não ao tempo político, ao tempo do poder, e buscava um fazer político com os de "baixo". Corretamente apontava que os partidos eram apenas títeres de uma elite ligada ao setor financeiro. Porém, na atual circunstância, Alejandro pensa que os aderentes da Outra Campanha apóiamObrador, ainda quesigam por um outro caminho, pois existe uma resistência à chegada de Calderón ao poder. "A Outra Campanha não se manifestou por AMLO, mas sim as pessoas individualmente. A Outra Campanha é uma organização profunda e do povo, que tem um outro caminho e destino", diz. Alejandro defende que o próprio subcomandante Marcos reconheceu recentemente Obrador como uma liderança de força.
Vínculos sociais
É claro que os diferentes movimentos mexicanos (Outra Campanha, governo legítimo, APPO) estão de certo modo entremeados. Por isso, por exemplo, existem aderentes da Outra Campanha que reconhecem a fraude e querem Obrador no lugar de Felipe Calderón. Embora a única coisa certa seja o apoio incondicional à luta da APPO em Oaxaca.
A crítica zapatista contra Lopez Obrador, iniciada ainda nas primeiras reuniões da Outra Campanha, não comprometeria a credibilidade zapatista, risco que os próprios zapatistas reconheciam no texto da Sexta Declaração? Alejandro responde: "Não, pois o que os zapatistas estão falando é a verdade, todos sabem que a classe política está deteriorada. Eles apontaram as pessoas que estão perto de AMLO, que realmente são legisladores corruptos, que estiveram ligados a Salinas de Gortari".
Quem pode se dar mal em meio a esse apoio cidadão em torno de Obrador (e de outras experiência populares de organização) é justamente a classe política decadente, na sua busca de privilégios. Pois, Obrador, solitário e individualmente, mantém o seu carisma junto à população.
Retirado do site do Brasil de Fato.
http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/internacional/news_item.2006-11-22.4952666901
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