4.11.06


Um dia de esperança e paixão

“Quando penso em minha Terra, penso sobretudo no sonho possível – mas nada fácil – da invenção democrática de nossa sociedade.”(Paulo Freire. À Sombra desta Mangueira, 1995.)

“O amor é uma intercomunicação íntima de duas consciências que se respeitam. Cada um tem o outro como sujeito de seu amor. Não se trata de apropriar-se do outro.” (Paulo Freire. Educação e Mudança, 1979.)

Para falar em mudança, em transformação é necessário falar de duas coisas: esperança e paixão. Por isso trago duas frases de nosso grande Mestre Paulo Freire. A primeira sobre a esperança e a utopia necessária para nosso luta cotidiana e a segunda, também na mesma linha, mas falando do amor que temos que ter com o outro, a alteridade, o dialogo e a comunicação necessária nas relações. Por que falar destas coisas? Por que hoje foi um dia onde a esperança e a paixão se fizeram presentes: visita ao assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e filme sobre a ditadura militar Argentina, “La noche de los lápis”, e a paixão.
Sonhar o sonho possível é o que o MST vem construindo nestes 22 anos de luta, de persistência, de afirmação e de construção de um projeto onde o homem e a mulher sejam sujeitos da sua história. Ao longo destes anos eles vem tentando construir uma sociedade onde não haja desigualdade, onde a fraternidade reine com a justiça, onde todos sejam irmãos, companheiros e companheiras. Isso ficou perceptível no Assentamento Jair Antônio da Costa, onde desde as crianças até as pessoas mais idosas tem orgulho de dizer “Sou do MST”. Afirmar esta identidade é afirmar um projeto de utopia, de esperança. É afirmar uma luta que continua presente apesar da maquina do capitalismo e da sociedade neoliberal. Uma luta feita de corações que sonham.
Ver no rosto das crianças semterrinhas a paixão e a mística do projeto é perceber que nem tudo está perdido, que ainda resta no fundo de nossos corpos o grito por liberdade. É ver naquelas pessoas que vivem em uma “cidade de lona preta” que é possível sim construir um outro mundo, uma outra sociedade. Ver que todo o processo histórico de luta dos movimentos sociais e das pessoas ainda continua no coração e nos pés fincados no chão, e que é expandida para todos os que vivenciam a proposta e o projeto, e que saem destas vivencias convencidos que temos que destapar nossos potes e abraçar esta causa e esta luta. Perceber que os lápis ainda escrevem, que os corações ainda pulsam, que as vozes ainda cantam e gritam, que as mãos ainda bradam por esperança e por mais espaços de luta e de igualdade. E que apesar da escuridão ainda existe luz, é só abrirmos os olhos.
Essa é a intercomunicação do amor, da esperança e da luta...a paixão que nós move a todos e a todas a construção deste novo amanhã.
Paixão que vemos nos olhos de nossa companheira do lado este ardor por engajar-se neste projeto, paixão nos nossos olhos pela utopia contida nos olhos verdes, no abraço gostoso e no carinho da companheira que se faz presente na luta, na proposta e na opção de construir.

Axé, Aurelê.....

Elisandro Rodrigues
Acadêmico de Pedagogia, militante social e apaixonado pelo verde dos olhos e pela esperança
Novembro de 2006

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Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento