6.3.10

Flores na parede

Marcos estava deitado na rede olhando o estranho quadro na parede da casa de Julia, sua amiga. O quadro era uma janela com dois vasos de flores pendurados. Nas flores pequenos botões nascendo. Fora chamado para uma reunião como havia poucas pessoas e a conversa acabou tomando outros rumos com violão e um mate.

Marcos pensava no vazio do significado do quadro e na paixão que aumentava e corroia a saudade no seu peito. Ia moldando seus pensamentos em formato de janelas: abrindo uma, fechando outra, esbarrando sem querer com o olhar nas flores. Pensamentos de flores, de ventos e janelas. A conversa das meninas deitadas no colchão tocando musica era sobre os amores e as distâncias.

Ele deixava o pensamento acariciar a distância e as lembranças doces da saudade amarga. Colocava pedaços da menina do sorriso e dos dedinhos para dentro dele a todo instante, como um mantra lembrava-se do seu sorriso o que acalentava a alma e o deixava mais tranqüilo.

O quadro estranho na parede estava lá com suas flores e janelas abertas para um vôo livre do pensamento. O embalo da rede lembrava o colo e os abraços de seu amor. Lembrou de uma passagem de Rubem Alves “o amor mora nas presenças das ausências”. Na arquitetura de surpresas ela se fez [na]morada. A tranqüilidade da rede e o embalo da música tocada “...um beija-flor invadir a porta da sua casa te der um beijo e partir fui eu quem mandei o beijo...” assim como o beija-flor que dá o beijo e parte ele adormeceu pensando na janela com flores e no seu amor.

Elisandro Rodrigues

Um comentário:

sindrominha disse...

oi gostaria muito que conhecesse o blog sobre síndrome do pânico e a falta de um manual para esse tortuoso caminho. Agradeço desde já.

Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento