29.8.11

Hospício é Deus


"...Estou no hospício, Deus. E hospício é este branco sem fim, onde nos arrancam o coração a cada instante, trazem-no de volta e o recebemos: tremulo, exangue - e sempre outro. Hospício são flores que se colam em nossas cabeças perdidas em escadarias de mármore antigo, subitamente futuro - como o que não se pode ainda compreender. São mãos lentas levantando-nos para não sei onde - paradas bruscas, corpos sacudidos se elevando incomensuráveis: Hospício é não se sabe o que, porque Hospício é Deus". Maura Lopes Cançado - Hospício é Deus.

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Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento