16.6.07


A morada de um coração

“Quanta maldição, meu coração não quer dinheiro, quer poesia...” (Maldição – Zeca Baleiro)

Qual seria a melhor definição para se dar aos nossos sentimentos, alguns se atrevem a dizer que é a confusão. Confusão de sentimentos que habita nossos seres e nossos corações. Ainda mais quando se trata do sentimento “amor”. Que loucura se torna nossa vida quando começamos a senti-lo através da paixão, do suar frio, do tremer as pernas quando vemos a pessoa da qual gostamos.
Dizemos que o coração é o lugar onde mora e habita o amor. E que para adentrá-lo precisamos ser convidados. Mas quando não se convida alguém para entrar. Quando esse alguém chega de supetão, empurra as portas, quebra as janelas, e entra como um vendaval espalhando os arquivos e os sentimentos já organizados e acomodados. O que fazemos com este alguém?
Pedimos para ele sentar, se acomodar, tomar uma xícara de café. Ou oferecemos algo mais forte: uma cerveja, um vinho, uma cachaça? Quem sabe um chá para se aquecer? E se essa pessoa não quiser nada disso. Se ela quiser passear pelos cômodos de nosso coração, visitar nossos sonhos, e for perfumando com o encanto que carrega cada lugar que passa, deixando sua marca, seu cheiro. E se ela se cansar e quiser sair de nosso coração, do nosso território sagrado: deixamos? Impedimos? Trancamos as portas e fechamos as janelas? Ou simplesmente deixamos ir, com um convite de que volte sempre, mas que avise da próxima vez?
E se depois que esse alguém for embora, sentirmos nosso coração vazio, só com o perfume no ar, preenchendo cada canto de nós. O que fazemos: corremos atrás dessa pessoa, procuramos nos quatro cantos do mundo, nos ventos da liberdade, nas brisas de outono...aonde vamos procurar se não sabemos como encontra - lá? Encontrar pelo perfume? Pelo cheiro? Por fotos? E se não a acharmos e sua falta começar a se tornar uma saudade. Saudade essa que nos enchem de mais paixão, que arrebata nossos sentimentos tornando se angustia. Angustia por não ter essa pessoa, por não vê-la, não tocá-la, não senti-la.
Dizem que para o coração não existe razão, apenas aquele sentimento de será ou não, um motivo para ir além. E se quisermos ir além, e nesse além descobrirmos o coração dessa pessoa que adentrou o nosso. Voltamos correndo para o nosso e nos trancamos? Esperamos uma oportunidade para pedir permissão para entrar? Entramos como entrou no nosso? Deixamos ficar e perceber o que acontece com este coração misterioso.
E se ficarmos e notarmos que este coração trouxe algumas aspirações quando saio de dentro do nosso: as belezas, as poesias, os sonhos. Nem notamos que havia faltado alguma coisa, passamos tanto tempo organizando e se perguntando o que fazer, que não percebemos que esse alguém gostou de nosso amor, do nosso território, e que no seu está tentando construir algo parecido como o nosso. Ficamos ali parado? Voltamos para o nosso lugar, quentinho e aconchegante, ou adentramos na bagunça desse outro alguém.
E se de supetão invadimos o coração desse outro alguém, e sem pensar começamos a falar que está tudo errado, que isso não é aqui, que aquilo é lá. E se neste movimento sentirmos agarrados, abraçados, beijados por este alguém....e ficarmos assim, juntinhos, sentindo o chamego e o aconchego.
Sabemos que já estamos apaixonados, envolvido por este alguém. Nós que fomos tão ajustados na mesmice do nosso território, que sempre tivemos medo de mudar, de ousar, de lutar. O que fazemos?
Amamos, é isso que fazemos, e nisso permanecemos....Sem medo de bagunçar o já organizado coração. Com a loucura do amor ficamos e retribuímos os beijos e os abraços. Entregando assim a chave de nosso pobre coração, já arrebatado e conquistado.

Elisandro Rodrigues
Final de outono. Frio. Amando um coração bagunçado.
16 de junho de 2007.

*Texto escrito depois de uma conversa com a amiga, Pauline.


Com sentimentos de um amor dedicado a uma princesa, um flor que me encantou e me encanta com seus sorrisos e abraços.



Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento