14.5.09

Coração que doí na chuva.


Chove na cidade. O dia está cinza. Faz frio na cidade de Porto Alegre. Guto senta calor observando o frio do lado de fora de sua sala de trabalho. O ar condicionado está ligado no quente. Ele espera dar 17:30 para ir embora.

17:35 Guto vê a multidão saindo de seus trabalhos e tomando as ruas. Todos com guarda-chuvas abertos, de todos os tamanhos e cores. As pessoas caminham em direção a suas casas, escolas, faculdades. Guto apenas caminha. Seu guarda-chuva permanece fechado em sua mão. Caminha sentindo a chuva em seu corpo. A água escorre pelo seu rosto se misturando ao salgado das lágrimas que caem de seus olhos. Chora com as flores recém cortadas perdem o seu perfume.

Se sente como uma flor podada. Observa as pessoas sem guarda-chuva escondendo debaixo das marquises e dentro das lojas. Os mais apressados colocam sacolas e papeis sobre a cabeça e correm embaixo da chuva. Guto apenas caminha sentindo o corpo sendo lavado. Caminha devagar, as pessoas o olham espantadas – o que uma pessoa faz no meio da chuva caminhando devagar? Só pode ser um louco.

Mas ele não é louco. Apenas quer sentir a liberdade da chuva em seu corpo. Suas roupas molhadas grudando no corpo e gelando-o. As pessoas não vem seu coração. E seu coração doí. Guto pensa que a chuva pode aliviar um pouco essa dor. Dor de flor recém cortada. Dor de coração por amar demais. Ele caminha indo contra o fluxo. Passa pela Andradas e sobe em direção a Borges de Medeiros. Lentamente vai chegando onde quer chegar – em cima do viaduto da Borges – Viaduto Otávio Rocha.

No viaduto observa os carros e as pessoas. Está ensopado mas não dá bola. Olha para baixo e calcula a altura – não adiantaria de nada pular, a queda não seria grande e sua dor apenas aumentaria. Fica pensando por quê coração tem que doer. Não entende e não compreende. A chuva vai acalmando e a cidade começa a silenciar. A noite chega. Por trás das nuvens as estrelas estão brilhando. Quem sabe depois atrás da dor no seu coração possa estar a alegria e a felicidade.

São 20:30 e Guto vai para casa molhado e com uma flor na mão.


Elisandro Rodrigues

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Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento