19.11.11

::A Fo[car]tografia e os Pormenores das Artes da Vida::

Nesse emaranhado cartográfico fiquei pensando por que janelas olhar esses fragmentos do vivido e experienciado através de fotos [cartografia fotográfica], fico me perguntando: o que são esses fragmentos que vivemos [vividos]?D[o] que eles dizem, de que subjetividade estamos falando, de que processos, o que [não] é capturado pelo olho? O que [não] olhamos?

Capturando uma palavraimagemfotografada de Barthes [da Câmara Clara, 2009] esses processos, essas imagens em fragmentos seriam um #pormenor. Esse conceito molhou meu corpo, me coloriu, me afetou [talvez o #punctum Barthiano].

Nesse espaço habitualmente unário, por vezes (mas, infelizmente, raras vezes) um <<pormenor>> chama-me a atenção. Sinto que a sua presença por si só modifica a minha leitura, que é uma nova foto que contemplo, marcada, aos meus olhos, por um valor superior. Este <<pormenor>> é o punctum (aquilo que me fere)....Do ponto de vista da realidade (…) toda uma causalidade explica a presença do <<pormenor>> (…) o pormenor é dado por acaso e mais nada...” [Barthes, pg, 51]

Esses #pormenor[es] dados por acaso, que ferem nossa atenção, machucam nossos olhos, nossos corpos são o que nos impulsionam a clicar [disparar] fotos apenas pensadas [apenas imaginadas]. Ficamos com essas imagens em nossas mentes [in]visível, nos mo[v]im[enta] para o cotidiano de nossas vidas.

As imagens se comunicam com nossos corpos “tudo o que podemos dizer é que o objecto fala, induz, vagamente, a pensar” [Barthes, pg 47]nos atinge com seu #pormenor, nos fere. Grita em silêncio dentro de nossos olhos [na invisibilidade das cores], provoca estreme[nas]cimentos, “o que eu vejo é o pormenor descentrado” [Barthes, pg 60]. Nas correrias do cotidiano olhamos sem ver. Não deixamos as imagens entrar, não deixamos as imagens pensadas [imaginadas] saírem.

Barthes fala que devemos “nada fazer, fechar os olhos, deixar que o pormenor suba sozinho à consciência afectiva”[Barthes, pg 64], dar tempo a essa #pormenor é deixar o “olhar tátil” de Bavcar [Memória do Brasil, 2003] nos guiar, ser também uma câmara escura, fazer as imagens pensadas palavras, “olhar com nossos próprios olhos, por mais frágeis que sejam”[Bavcar, pg 140].

Abrindo-me para meus próprios olhos [tentando enxergar com o corpo, fechando os olhos] um #pormenor “entrepalavras” [Bavcar, pg 120] emergiu de um poeta [Manoel de Barros] e fo[car]tografou que “Imagens são palavras que nos faltaram./Poesia é a ocupação da palavra pela Imagem./Poesia é a ocupação da Imagem pelo Ser./Acho que o nome empobreceu a imagem” [do poema Uma didática da invenção, e, O guardador de águas].

Nesses mo[v]im[ento]s de pensar o que [não] olhamos, e de que forma [não] olhamos, esse poeta brincou com a palavra e a imagem. Bavcar fala que as vozes fazem ressuscitar as imagens, e que as vezes “as palavras se vão como os instantes que elas enfeitaram.” [pg 130],mas creio que as imagens enfeitadas permanecem guardadas e saltam ao nosso corpo [olhar tátil] com os #pormenores nos encontros cotidianos.  

Abrir. Fechar. Capturar. Disparar. Palavra. Imagem. Estar aberto ao #pormenor é o que convoca a essas experimentações fo[car]tográficas, e para o dia 03/12 que tal experienciarmos o brincar de palavras e imagens de Manoel de Barros com as poesias do livro Ensaios Fotográficos*? Na espera de vocês para fechar os olhos, enfeitar as vozes e palavras, deixar o #pormenor surgir e quem sabe fotografar o silêncio.
*Podemos achar as poesias desse livro na internet, ficamos apenas com a primeira parte “ensaios fotográficos”, os nomes do poemas são: O Fotógrafo/Gorjeios/ O Roceiro/Línguas/O Aferidor/Comparamento/Despalavra/Ninguém/O vento/Miró/Ruína/Bola sete/ Rabelais/O Punhal/O Casamento.

Elisandro Rodrigues


:::Evgen Bavcar:::
Portrait with hands

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Entra[saí]da - Manoel de Barros

Distâncias somavam a gente para menos. Nossa morada estava tão perto do abandono que dava até para a gente pegar nele. Eu conversava bobagens profundas com sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim:

O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho. O cinzento da tarde me empobrece. E o rio encosta as margens na minha voz.

Essa fusão com a natureza tirava de mim a liberdade de pensar. Eu queria que as garças me sonhassem. Eu queria que as palavras me gorjeassem. Então comecei a fazer desenhos verbais de imagens. Me dei bem.

[...]

1)É nos loucos que grassam luarais; 2)Eu queria crescer pra passarinho; 3) Sapo é um pedaço de chão que pula; 4) Poesia é a infância da língua. Sei que os meus desenhos verbais nada significam. Nada. Mas se o nada desaparecer a poesia acaba. Eu sei. Sobre o nada eu tenho profundidades.

Siente como Sopla el Viento